Crianças e adolescentes moradores de municípios com menor renda tiveram menos acesso a tratamentos
As crianças dos municípios mais pobres no Brasil que foram hospitalizadas por conta da Covid-19 passaram por um risco quase quatro vezes maior de morrer se comparadas às das cidades mais ricas que também enfrentaram a doença. A conclusão é de um estudo recém-publicado por pesquisadoras da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
A pesquisa divide os municípios do país em dez faixas de renda por habitante. Na mais rica delas, a taxa de letalidade da Covid-19 entre crianças internadas foi de 4,1%. Já no caso da mais pobre, esse número subiu para 15,5%.
Entre adolescentes, que também são levados em conta pelo estudo, a disparidade na taxa de mortes se repetiu: foi de 8,8% nos municípios mais abastados para 16,2% nos de menor rendimento per capita.
O levantamento também faz comparações entre regiões. No Sul do país, com 4,5% de letalidade, a Covid matou menos da metade do que foi registrado no Nordeste (11,1%), em termos proporcionais ao número de crianças hospitalizadas.
O estudo ainda identificou um atendimento mais carente às crianças moradoras das cidades mais pobres. O percentual das que contaram com tomografias, por exemplo, foi praticamente a metade (5,7%) dos casos registrados nos municípios mais ricos (11,8%).
Os tratamentos das crianças das cidades com menor rendimento por habitante também envolveram, proporcionalmente, menores números de exames de raio-x e de coleta de amostra biológica, de uso de suporte ventilatório e de internações em Unidade de Terapia Intesiva (UTI). Isso também ocorreu entre adolescentes.
A pesquisa reforçou o entendimento da Covid-19 como uma sindemia, conceito que une os termos sinergia e pandemia. Em linhas gerais, ele se refere às situações em que duas enfermidades interagem e têm um impacto ampliado por condições sociais.
Ao comparar as cidades, o estudo mostra que o coronavírus se somou a outros problemas de saúde e atingiu com maior força populações já vulneráveis. É o que explica a pesquisadora Caroline Fabrin, que conduziu o trabalho em seu mestrado em saúde coletiva, sob orientação da epidemiologista Alexandra Boing.
— É o acúmulo de múltiplos fatores que afetam negativamente a vida dos residentes de locais em desvantagem social, como piores condições de vida e trabalho, menor acesso a serviços de saúde e maior prevalência de doenças crônicas — disse ela para uma publicação da UFSC.
— [Há ainda] Moradias superlotadas, onde o distanciamento físico é inviável, e situações que impossibilitam o trabalho remoto. Essas condições podem aumentar a exposição ao vírus e sua consequente disseminação. Então acaba tudo isso sendo um catalisador para os casos mais graves — completou.
O estudo tratou da letalidade de pessoas de 0 a 18 anos no país de março de 2020, quando a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a pandemia do novo coronavírus, a dezembro do ano passado.
Ele usou dados de mais de 22 mil pessoas, reunidos no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe), que registra hospitalizações e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).
Com informações do NSCTotal