Decisão diz que a instituição deve garantir "a pacientes que procurem o serviço de saúde a realização de procedimentos de interrupção da gestação nas hipóteses de aborto legal"
O Ministério Público Federal (MPF) emitiu uma recomendação para que o Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago, em Florianópolis, realize o aborto na criança de 11 anos, grávida após ser estuprada em Santa Catarina. A decisão foi publicada nesta quarta-feira (22) e é assinada pela procuradora da República Daniele Cardoso Escobar.
De acordo com o documento, no qual a NSC teve acesso, a instituição deve garantir "a pacientes que procurem o serviço de saúde a realização de procedimentos de interrupção da gestação nas hipóteses de aborto legal", independentemente da idade gestacional ou do peso do feto. Quando a família da vítima procurou a unidade, médicos alegaram que o procedimento só poderia ser realizado com até 20 semanas de gestação - a criança estava na 22º semana.
Ainda conforme a procuradora, é "desnecessária qualquer autorização judicial ou comunicação policial" para realizar o procedimento.
Por fim, o MPF recomenda o aborto legal no caso da menina, se ela voltar a procurar o Hospital Universitário. A unidade tem até a manhã desta quinta-feira (23) para se manifestar sobre a decisão.
O hospital é alvo de uma investigação do MPF. O inquérito civil, instaurado na segunda-feira (20), prioriza a apuração dos "fluxos e trâmites do HU" em relação ao caso. Detalhes do procedimento não foram divulgados.
O MPF alegou, ainda, que não irá se manifestar sobre o caso específico da criança, por conta do segredo de justiça. Porém, irá adotar "todas as medidas cabíveis para zelar pelo cumprimento da lesgislação aplicável, resguardando os direitos de qualquer pessoa que vivencie situação prevista pela norma, no caso, as hipóteses de aborto legal".
Veja a decisão na íntegra
Em nota, o HU reiterou que não repassa informações sobre procedimentos relacionados ao prontuário de pacientes e, por se tratar de um caso que corre em segredo de Justiça, não irá comentar a situação da criança. Além disso, a unidade diz que orienta as famílias que, ao passar do período estipulado em protocolo, recorra judicialmente para ter acesso ao procedimento.
"Realizamos inúmeros encaminhamentos ao poder judiciário que, normalmente, defere o pedido com agilidade, compreendendo a complexidade e urgência da situação. No entanto, há situações, pontuais, cuja conduta do poder judiciário não corresponde à expectativa da equipe assistencial do HU em atender as demandas de saúde na sua integralidade.", diz o comunicado.
Veja a nota na íntegra:
"O HU-UFSC/Ebserh não repassa informações sobre procedimentos relacionados ao prontuário de pacientes atendidos no hospital, em respeito ao sigilo das informações e à privacidade do paciente. Além disso, manifestações, no momento, não são possíveis porque o caso corre em segredo de justiça.
O Hospital Universitário (HU/UFSC/Ebserh) é referência para o município de Florianópolis para a interrupção legal da gestação e desde 2005 segue as Portarias e normas técnicas definidas pelo Ministério da Saúde.
Ao longo desses anos, recebemos crianças e adolescentes, provenientes de todo o Estado de Santa Catarina, para realizar interrupção legal da gestação em decorrência de estupro de vulnerável. Quando ocorre de ultrapassar o limite da idade gestacional estabelecido pelo protocolo para conduzir o procedimento, orientamos a família a recorrer judicialmente para assegurar esse direito.
Realizamos inúmeros encaminhamentos ao poder judiciário que, normalmente, defere o pedido com agilidade, compreendendo a complexidade e urgência da situação.
No entanto, há situações, pontuais, cuja conduta do poder judiciário não corresponde à expectativa da equipe assistencial do HU em atender as demandas de saúde na sua integralidade.
É importante destacar que o procedimento de aborto legal no HU depende desta autorização da justiça quando ultrapassa as 20 semanas e 00 dias.
O MP não baseou seu pedido no parecer da equipe especializada do HU-UFSC.
Em todas as circunstâncias o HU buscou garantir a assistência em saúde e os direitos humanos à criança, ofertando assistência à saúde, e avaliação da equipe multidisciplinar em relação à melhor conduta para a situação.
Esta instituição, que é uma das únicas do Estado de Santa Catarina a oferecer um serviço de aborto legal, sempre trabalhou com intuito de assegurar o direito das mulheres".
Relembre o caso
O caso ganhou repercussão após reportagem do Intercept Brasil em parceria com o Portal Catarinas, publicada nesta segunda-feira (20). A criança foi levada pela mãe a uma unidade de saúde em Florianópolis dois dias após ter descoberto a gestação. No entanto, como estava com 22 semanas, o Hospital Universitário se negou a realizar o procedimento - na instituição, é permitido aborto até 20 semanas.
Em despacho, a juíza Joana Ribeiro afirmou que o encaminhamento ao abrigo, inicialmente feito a pedido da Vara da Infância da Comarca de Tijucas, na Grande Florianópolis, para proteger a criança do agressor, uma vez que havia a suspeita de que a violência sexual ocorria no lar, agora tinha como objetivo de protegê-la do aborto.
Nesta terça-feira (21) a criança pode voltar para casa após uma decisão da Justiça. A advogada da família também entrou com um recurso para que a menina realizesse o aborto.
Com informações do NSCTotal